terça-feira, 29 de junho de 2010

Qualidade não é Virtude

A edição nº 100 da Revista "O Patologista" apresenta uma matéria sobre o controle de qualidade em anatomia patológica. Inicia citando Aritóteles ("filósofo, cientista e médico") e compara rapidamente a busca de "qualidade" (hodierna, sustentada por checklists) com as especulações filosóficas da antigüidade clássica. O propósito do presente post não é discutir o mérito da questão sobre mecanismos de qualidade em patologia. Para tanto, recomendo vivamente a leitura do post PICQ do PICQ, no blog Liberdade Reflexiva. No momento gostaria apenas de sair em defesa de Aristóteles, injustamente retratado (e sem direito de resposta) como gestor de qualidade dos tempos antigos. Ainda que alguém possa dizer que se trata tão somente de um recurso comparativo para chamar a atenção para o tema, discordo veementemente e, para isso, pondero sobre o valor de verdade dos 5 pontos (5S´s), a saber:

1- "Qualidade não é um ato, é um hábito": Falso. Justificativa: Em duas partes: a) Aparentemente a palavra "qualidade" no título da matéria tomou o lugar da tradução mais habitual de areté (virtude), logo, aquele conceito mais afeito aos sistemas de produção do século XX está forçosa e anacronicamente alinhado como o pensamento ético da antigüidade. Tal comparação é perigosamente confusa porque sobrepõe perspectivas éticas a aspectos de natureza puramente técnicos da atividade médica. Aliás, esse é um ponto que merece discussão: sobre o ajuizamento de valor, quem garante a excelência? Quem é o terceiro moralmente instituído que responde pelo grande patologista-celestial-onisciente? Sobre quais prerrogativas está assentado o controle externo da ação médica? Onde fica o controle de qualidade do controle de qualidade? Tais títulos de acreditação, não seriam mais um artifício de mercantilização evidentemente não-baseado-em-evidências? b) Há que se ter cuidado com o uso da palavra "ato" com referência ao texto aristotélico dado que esta freqüentemente se enquadra nos conceitos categoriais de ato-potência. O que não está em ato, está em potência, como a estátua está no mármore a ser esculpido. Assim, parece que a palavra em questão merece maior rigor em seu uso, tradução e citação.

2- "Qualidade não é um ato, é um hábito": Falso de novo. Justificativa: Os livros que constituem a Ética a Nicômaco (foto acima) são de estrutura complexa e alguns se inserem no contexto geral de estudo sobre a virtude. Esta é definida, no capítulo II, como um estado habitual que dirige a decisão e que consiste no justo meio relativo a nós, cuja norma é a regra moral. Nada disso me parece, nem de longe, refletir os conceitos modernos relatados na matéria. Da forma como exposto, o conceito de "hábito" fica mais ligado à repetição ad nauseam de procedimentos operacionais padrão que supostamente contribuirão para "preservar a vida, nosso bem maior". Tal noção de hábito não reflete o percurso argumentativo de como é tratada a questão do tempo e da experiência na construção da phronesis (sabedoria).

3- "Aristóteles era médico". Falso.
Justificativa: Galeno era médico, o português-prêmio-nobel que inventou a lobotomia era médico, ACM era médico e médico foi o pai de Aristóteles chamado Nicômaco, influenciador dos estudos do filho em terrenos que hoje chamamos biologia. Aristóteles mesmo, não. Não tinha inscrição no Conselho.

4- "Aristóteles era cientista". Falso. Justificativa: Falso... se entendermos a ciência (logo, o cientista) nos moldes de como ela se configurou a partir do século XVII. Cientista foi Pasteur que inventou o leite-longa-vida e teria, facilmente, em cena surreal, seu laboratório interditado pela vigilância sanitária (basta observar as não conformidades nas fotos da época: frascos não rotulados, equipamentos dispostos no chão, ausência de caixa apropriada para descarte de pérfuro-cortantes, etc).

5- "...já na antigüidade a qualidade era um bem almejado e cultivado". Falso. Justificativa: O que era almejado era o próprio bem, metáfora do Sol na caverna de Platão ou a eudamonia: "o bem é aquilo perante o qual nada resiste" (Aristóteles). O bem é um fim em si mesmo, não a qualidade.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Doença de Bowen

All Bowen’s disease is squamous cell carcinoma in situ, but all squamous cell carcinoma in situ is not Bowen’s disease.

Trata-se de letter publicada no periódico Journal of Cutaneous Pathology, por Adam A. Martin. O autor cita a referência primária de Dr John T. Bowen [1] para reforçar que poucos dos casos que denominamos Doença de Bowen (DB) são, realmente, Doença de Bowen. A maioria, lesões em áreas de exposição solar, enquadra-se na denominação de carcinoma de células escamosas in situ (CCEIS), ou, no máximo, quando apresenta histologia com o aspecto descrito na DB original, "CCEIS de padrão bowenóide". O autor atribui, como possível causa da confusão, a primeira edição do 'Lever' e recentes publicações do 'Andrews', que denomiam DB e CCEIS como sinônimos. DB ocorre em áreas não expostas, é um tipo de CCEIS e guarda relação com exposição ao arsênio.

[1] Bowen JT. Precancerous dermatoses: a study of two cases of chronic atypical epithelial proliferation. J Cutan Dis Including Syphilis 1912; 30: 241.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Adjuvant on Line

https://www.adjuvantonline.com/online.jsp
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Decision making tools for health care professionals
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The purpose of Adjuvant! is to help health professionals and patients with early cancer discuss the risks and benefits of getting additional therapy (adjuvant therapy: usually chemotherapy, hormone therapy, or both) after surgery. The goal is to help health professionals make estimates of the risk of negative outcome (cancer related mortality or relapse) without systemic adjuvant therapy, estimates of the reduction of these risks afforded by therapy, and risks of side effects of the therapy. These estimates are based on information entered about individual patients and their tumors (for example, patient age, tumor size, nodal involvement, histologic grade, etc.) These estimates are then provided on printed sheets in simple graphical and text formats to be used in consultations. Because of the complexity of interpretation of some of the input information (ambiguities about tumor size, margins, etc.), the information should be entered by a health professional with some experience in oncology (cancer medicine). © 2003-2010 Adjuvant! Inc.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

A visão do oncologista

REUNIÃO CIENTÍFICA RESIDÊNCIA MÉDICA PATOLOGIA HC/UFMG
Convidamos a todos para palestra com o oncologista Dr. Daniel de Castro Monteiro,
nessa sexta feira dia 11/06, às16:30h, que versará sobre "A importância do exame anatomo-patológico na decisão do tratamento oncológico do câncer de mama (A visão do oncologista)"
Sem mais para o momento, pt saudações.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Prof. Luiz Otávio Savassi Rocha

No dia 23 de junho de 2010 será realizada Solenidade de Outorga do Título de Professor Emérito ao Professor Luiz Otávio Savassi Rocha. Trata-se da maior honraria acadêmica que se pode conferir no meio acadêmico.

Segue abaixo o discurso proferido pelo Prof. Luiz Otávio Savassi Rocha por ocasião da solenidade de formatura da 107ª turma da Faculdade de Medicina da UFMG.

"Caros formandos,

No momento em que sou alvo de tão honrosa distinção, evoco, emocionado, a memória do Prof. Luigi Bogliolo, responsável direto pelo meu ingresso na carreira universitária. Demitido, por razões ideológicas, da Universidade de Pisa, no limiar da 2ª Guerra Mundial, Bogliolo foi obrigado a emigrar para o Brasil, desembarcando, na então capital da república, em janeiro de 1940; quatro anos depois, transferiu-se para Belo Horizonte e fundou, em nossa querida Faculdade, uma escola de patologia que se imporia, por seu alto nível, no cenário científico do país adotivo. Ao que tudo indica, o que mais parecia empolgar o inesquecível mestre era a possibilidade de investir no jovem ávido de conhecimento, estimulando-o a desenvolver a consciência crítica e a descobrir as coisas por si mesmo. Essa “paixão de formar” fica evidente nos versos de um poema de sua autoria, redigido a lápis, dias antes da sua morte, por intermédio do qual, pressentindo o fim próximo, ele ensaiava uma reconstituição sumária de sua vida, uma espécie de balanço: “Pulsare à fatto avidi cervelli di giovani, e com le dita che sentivano, e com amore, com amore à dato forma ad alcuni.” ( “Fiz pulsar ávidos cérebros de jovens, e com os dedos que sentiam, e com amor, com amor dei forma a alguns.” ).

Isso posto, resulta inevitável a pergunta: qual seria a origem dessa “paixão de formar” que impulsionava Bogliolo, e que me impulsiona, com se abrigássemos, no recôndito de nosso ser, uma espécie de chama que nunca se apaga? Há quem suponha que semelhante inclinação, máxime em se tratando da área médica, deriva de motivações inconscientes, que implicam uma busca da reparação infinita, de modo a mobilizar toda a energia do professor que, obstinadamente, se dedica ao seu ofício. É possível que assim seja. Em questões dessa natureza, porém, parece mais prudente adotar a suspensão do julgamento e optar pelo silêncio contemplativo, pois, como ensina Guimarães Rosa: “As coisas assim a gente mesmo não pega nem abarca. Cabem é no brilho da noite. Aragem do Sagrado. Absolutas estrelas!”.
Seja como for, penso ter procurado, ao longo de três décadas de exercício do magistério, privilegiar, em vez da transmissão mecanicista de conteúdos, a formulação de perguntas relevantes e o desenvolvimento da capacidade de raciocinar, ou seja, penso ter me comportado como uma espécie de catalisador – não mais que isso. Afinal, o que faz o catalisador se não limitar-se a diminuir a barreira que se opõe ao avanço da reação, facilitando a transformação dos reagentes em produtos? Encerrado o processo, ele se retira, sai de cena, como se necessário não fosse? Ocorre, porém, que, com o passar dos anos, revelei-me um catalisador peculiar, pois, ao contrário do que se observa na natureza – o catalisador não se altera quimicamente durante o processo -, à medida que eu me dedicava à formação dos alunos, ia sendo por eles reformado, assim como os pais são pelos filhos e os médicos pelo contato com os pacientes. Ainda bem que assim seja.
Neste início de caminhada - tão inquietante quanto rico de possibilidades -, que conselhos poderia lhes dar alguém que, explorando o mundo ao seu redor, se depara com a especulação financeira; a lógica cínica; o egocentrismo; o massacre publicitário; a transformação, num fim em si mesmo, do gesto intermediário de consumir; a degradação ambiental; a chamada “espiritualidade de resultado”; o recrudescimento dos fundamentalismos; a perda das referências; a pressa; o pragmatismo; a pasteurização das respostas às grandes indagações humanas; a prioridade das aparências; o embotamento afetivo; a banalização do sexo e da violência; a rápida obsolescência do saber que até pouco tempo se julgava bem estabelecido; a ânsia da apreensão matemática de todos os fenômenos, incluídos o comportamento e as emoções; a pletora das informações, à espera de quem opere a necessária síntese; à vivência do tempo no espaço cibernético, de modo a alterar os conceitos de passado e futuro e de impedir que se experimente a “espessura da realidade”; o aflorar, na área biomédica, de questões éticas aparentemente incontornáveis; a capacidade, sempre renovada, do Sistema de, sutilmente, apagar as diferenças entre as pessoas e negar sua singularidade?
Diante de tal quadro, devo confessar-lhes, torna-se muito difícil aconselhar. Mesmo assim, ouso deixar-lhes uma palavra final que, embora singela, vale como uma profissão de fé: não procurem alhures o que somente pode ser encontrado em seu próprio interior; lembrem-se de que não existem atalhos para a sabedoria; cultivem o desapego, pois não vale a pena agarrar-se ao efêmero; apurem a sensibilidade, como que afina um instrumento musical; busquem a beleza, onde quer que ela se esconda; na relação com o ser que sofre, privilegiem, acima de tudo, a empatia, cientes que o desamparo do homem moderno, a despeito de toda a tecnologia disponível, não é menor que aquele de seu ancestral, habitante das cavernas; ajudem enfim a inaugurar uma nova era, marcada pela delicadeza, ainda que isso lhes pareça a mais improvável das utopias.
Muito obrigado!
Sejam felizes!
Belo Horizonte, 7 de janeiro de 2000."

Programação (Agosto a Dezembro de 2010)

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segunda-feira, 7 de junho de 2010

Focusing on leaves while ignoring the forest

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Trata-se de recente trabalho (comentário) discutindo a (in)utilidade científica da publicação de relatos de casos e como esses relatos invadiram as publicações de dermatopatologia:
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For example, a clinically unusual presentation of an uncommon disease with a stereotypical histopathological presentation should have a very low priority for publication. Additionally, original articles describing the application of a new antibody randomly applied to cases without an apparent working hypothesis are of questionable value. The same holds true for an entity 'revisited' but without new insights presented.
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Segue o link do trabalho (mas para acesso a esse acho que carece de senha/login da CAPES ou congênere).

Aperio


Aperio has made the cover of Scientific American, with an article entitled Digital Diagnosis: Computerized Slides Speed Care (PDF).

Eu sei que é junho

Vista da janela do Laboratório do HC/UFMG às 17:45h.

Escreve aí...

Imagem #5 - Punção de linfonodo

Metástases de CCE em punção de linfonodo.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Liquid-based cytology

"The current results indicated that LBC is not expected to increase sensitivity even if it is used by interpreters who have extensive experience with this technique".
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Link aí:
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Accuracy of liquid-based cytology: Comparison of the results obtained within a randomized controlled trial (the New Technologies for Cervical Cancer Screening Study) and an external group of experts. Cancer (Cancer Cytopathol) 2010.

Imagem #4 - Células estromais bizarras

Pólipo gástrico com células estromais bizarras.

EYE FOR AN AI: MORE-THAN-SEEING, FAUXTOMATION, AND THE ENACTMENT OF UNCERTAIN DATA IN DIGITAL PATHOLOGY

  Olho para uma Inteligência Artificial: mais-do-que-ver, pseudo- automação e a instauração de dados incertos na patologia digital